quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

"Fear cuts deeper than swords"

Com o que deveríamos estar preocupados?


Esse foi o questionamento proposto pela revista científica online Edge às maiores mentalidades do planeta. As respostas, além de interessantíssimas, são bastante diversas. São 151 no total, e eu selecionei algumas que considerei "especiais" para comentar sobre elas aqui. Bom, caras que são professores de mecânica quântica estão entre os entrevistados, mas a intenção principal é mostrar que esses medos relatados fazem parte do nosso cotidiano, ainda que às vezes passem despercebidos. Vamos lá:

4. Que pseudociências vão ganhar terreno. – Helena Cronin, escritora, filósofa.

Não sei se já pararam pra realmente ler os papéis que nos entregam nas ruas, mas existe uma quantidade absurda de propagandas de paranormais que fazem consultas com "princípios científicos" - aparentemente uma fórmula de física pode trazer de volta a pessoa amada em 7 dias. A comicidade gerada por esses panfletos por vezes mascara a gravidade da prática, que manipula uma quantidade relevante de pessoas, além de ser em tese uma prática comercial na qual o cliente não recebe pelo que paga. A lista das pseudociências se estendem muito, porém se concentram ao redor do fator de sua existência: extorsão de dinheiro baseada nas crenças alheias. Estão na lista também astrologia, práticas de "terapia de conversão" (para a pessoa aparentemente deixar de ser homossexual), tratamentos medicinais sem fundos científicos ou mesmo empíricos. Entendam: não estou colocando em cheque questões religiosas ao ilustrar a opinião da filósofa. Estas práticas não se baseiam na crença/fé, e sim no aproveitamento distorcido dessas. 

Penny: Eu sou do signo de Sagitário, o que provavelmente diz muito mais do que precisam saber.

Sheldon: Sim. Diz que você concorda com a 'ilusão cultural de massa' de que a posição do sol relativa às constelações arbitrariamente definidas no seu nascimento de algum modo afeta sua personalidade.

5. Que a era do aceleramento da tecnologia vai nos dar muitas oportunidades para nos preocupar. – Dan Sperber, cientista social e cognitivo.

Para mim é impossível não relacionar essa opinião com o acontecimento da Guerra Fria. O desenvolvimento tecnológico atingiu um patamar tal que nossa própria destruição pode estar relacionada com nossas conquistas enquanto seres humanos.

7. O declínio da cobertura científica nos jornais. – Barbara Strauch, editora de ciências do New York Times.

Não apenas da científica. Lembram-se do artigo da Veja sobre homossexualismo? Você pode ter uma relação estável com uma cabra, só não pode se casar. Veja, we love you. <3

15. Que continuemos a defender tabus e palavrões. – Benhamin Bergen, professor associado de Ciência Cognitiva da UCS.

Não vou entrar em questões religiosas e nem falar sobre o aborto - coisas que considero "discutíveis", ainda que a minha opinião seja irredutível -, porém para mim é ABSURDO os entraves que algumas pesquisas (em especial com células tronco) encontram aqui no país e também lá fora. Enquanto isso, há pessoas esperando, assim como novas descobertas, simplesmente por tabus. Faço uma relação automática com a Idade Média quanto ao conceito de "Idade das Trevas": o conhecimento foi travado pela igreja por tantos anos e, considerando a rapidez dos avanços posteriores, é como se imaginar em um filme de ficção científica pensarmos em qual sociedade poderíamos estar hoje se o conhecimento possuísse "livre passe". E, se isso não é justificativa para você, que o seja pessoas condenadas a situações de vida vegetativa.

25. Extinção cultural, e o fato de que trabalhos de um obscuro escritor do Caribe nunca venham a receber atenção. – Hans Ulrich Obrist, curador da Serpentine Gallery.

Essa é uma questão sobre a qual sempre penso também. Quantas inteligências já ficaram na anonimidade por condições políticas ou sociais?

59. Que a humanidade pare de perseguir a observação detalhada. – Ursula Martin, cientista da computação.

Me sinto no direito de trocar "observação detalhada" por simples "interesse". O apatismo está cada vez mais presente na sociedade, o que nos faz subjugados aos detentores do poder e limitados por nós mesmos.

65. Que “estamos inarticuladamente perdidos na Modernidade. Muitos de nós parecem sentir o fim de algo, talvez uma insignificância fútil na nossa Modernidade.” – Stuart A. Kauffman, professor de ciências biológicas, física e astronomia.

Adolescentes e crianças frequentando consultórios psiquiátricos, uma família almoçando em Fast Food - em horários diferentes.

69. Que vamos passar tempo demais nas redes sociais. – Marcel Kinsbourne, neurologista.

O real problema das redes sociais não é sua presença diária, e sim o tempo gasto nessas apenas pelo costume. A grande verdade é que ao tentar se lembrar de um dia que tenha passado várias horas no computador  você consegue juntar pouquíssimas imagens. Em geral, nada de real importância acontece, porém aquilo consome nosso tempo como se fosse a solução para nossas vidas ou nossa própria solidão. Não é.

71. Que a lacuna entre notícias e compreensão está aumentando. – Gavin Schmidt, climatologista da NASA.

Não peguem opinião do autor por osmose, gente. Vocês não são papagaios. Reflitam sobre cada coisa que ler sob uma visão crítica.

79. A morte da matemática. – Keith Devlin, matemático.

"O binômio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo. O que há é pouca gente para dar por isso (...)".

Sempre fui apaixonada por matemática, mas, sinceramente, o ENEM (maior vestibular do país) simplesmente é uma ofensa à ciência. Matemáticos de relevância estão em falta no país, e não é uma prova com continhas de soma que vai estimular os jovens a buscarem profissões relacionadas. Principalmente falando sobre matemáticos ou físicos teóricos.

96. “Deveríamos nos preocupar com as consequências do nosso conhecimento cada vez maior sobre o que causa as doenças, e o que isso acarreta para a liberdade humana.” – Esther Dyson, catalisadora de start-ups de TI.

Comentário extremamente inteligente, eu realmente nunca parei para pensar sob esse ponto de vista. Quis colocá-lo aqui por achá-lo fantástico.

114. Que as instituições historicamente arraigadas impeçam o processo tecnológico. – Paul Kedrosky, editor.

Reforço que Igreja é instituição de relação espiritual e que é INADMISSÍVEL que ela impeça o desenvolvimento humano a partir de dogmas.

141. “A Perigosa Inabilidade da Sociedade de Raciocinar sobre Incertezas” – Aubrey De Grey, gerontologista.

Também me preocupo que um belo dia vou quebrar o pescoço de alguém que fala que "odeia filosofia porque é inútil". Incrível que todas escolas e turmas nas quais estudei não conseguem constituir 10 pessoas que entendam a importância dessas discussões. Não entra nem na questão a afinidade pelo assunto: você pode odiar matemática, mas com certeza gosta de sua existência porque não acharia legal um prédio caindo em cima da sua cabeça.


Para quem tiver interesse em ler todas as 151 respostas, o link é esse

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